O antigo Sínodo Evangélico do Brasil Central completa 113 anos de fundação neste ano de 2025. Foi o 1º Sínodo na região sudeste, central e norte do país, um dos quatro que vieram a compor a Federação Sinodal e, mais tarde, a Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil – IECLB. Conheça um pouco mais da história deste Sínodo e da IECLB
Fundação
O Sínodo Evangélico do Brasil Central foi fundado na Assembleia Geral que se reuniu no Rio de Janeiro nos dias 28 a 30 de junho de 1912. Fizeram parte desta assembleia comunidades relativamente independentes entre si. Eram elas: São Paulo, Santos, Campinas e Rio Claro no Estado de São Paulo; Campinho, Califórnia e Santa Leopoldia I e II no Espírito Santo; Juiz de Fora e Petrópolis em Minas Gerais e a Comunidade no Rio de Janeiro/RJ. Ato contínuo, uniram-se ao Sínodo as comunidades em Nova Friburgo/RJ, Belo Horizonte/MG, Teófilo Otoni/MG, Salvador/BA, Recife/PE, Belém/PA, Rio Ponte/ES. Elas sentiram-se guiadas pela promessa revelada na palavra de Cristo: “Eu estarei convosco todos os dias até a consumação dos séculos” (Mt 28.20). O objetivo principal era: melhor cumprir a tarefa missionária de ser uma comunidade evangélica no país.
Algumas particularidades que a história registra acerca deste Sínodo
a) na Assembleia de Fundação foram tomadas duas decisões importantes: 1) a solicitação de um pastor itinerante a Berlim para o atendimento das famílias dispersas em Minas Gerais e no Espírito Santo; 2) o estímulo da formação de grupos de OASE por todas as comunidades com o objetivo de “apoiar a assistência a doentes e pobres em geral, sobretudo a parturientes e solteiras, p. ex. pela contratação de uma diaconisa.” (FISCHER, Joaquim)
b) o Sínodo recém criado era de uma extensão geográfica enorme (Sudeste, Centro Oeste, Nordeste e Norte do país), com diferenças contextuais importantes (comunidades em grandes e pequenas cidades, interioranas e outras em situação de isolamento, comunidades constituídas e comunidades em formação, comunidades com pastor e outras dependentes de pastorados itinerantes) e também diferenças teológicas (estas fizeram com que as comunidades do Espírito Santo se unissem ao Sínodo Luterano com sede em Joinville/SC, deixando o Sínodo Evangélico Luterano – Caixa de Deus).
c) O Sínodo Evangélico do Brasil Central era Sínodo da diáspora e de pequenos grupos comunitários. Foi assim definido pelo Dr. Ernesto Schlieper, então Presidente da Federação Sinodal, na saudação ao livro do jubileu dos 50 anos:
com as suas particularidades de ser ao mesmo tempo o menor (dos 4 sínodos) quanto ao número de membros e paróquias, e o maior quanto à extensão geográfica da área de seu trabalho, justamente por isso tem a sua tarefa especial dentro da Federação Sinodal: de manter viva a responsabilidade de todos pelos pequenos grupos de cristãos evangélicos dispersos pelo Centro e pelo Norte do país, e de lembrar a Igreja que o Evangelho não nos foi confiado para o mundo em que vivemos, para que êle possa ouvir, por nosso intermédio, que não há salvação senão em Jesus Cristo. De todos que lhe pertencem, Cristo quer que sejam suas testemunhas, pois a todos se refere a sua palavra: vós sereis minhas testemunhas. Somente no desempenho dessa sua missão viverá a Igreja. (p. 02)
d) O Sínodo Evangélico do Brasil Central viveu o período das duas Guerras Mundiais. O P. Karl Gräter, eleito Presidente do Sínodo em 1948 no Concílio de Rio Claro, fala das dificuldades enfrentadas no período da Segunda Guerra Mundial quando as pessoas legalmente constituídas não puderam exercer seu papel, pastores alemães foram presos e a língua alemã proibida. Ao final da Guerra o Sínodo Evangélico do Brasil Central ainda estava vivo graças aos trabalhos de Benno Kersten (Rio de Janeiro), uma liderança não ordenada que assumiu todas as atividades institucionais e teológicas de 1942 a 1947. Escreve Kersten:
Na Páscoa de 1942 viajei a Campinho, Espírito Santo, para dar assistência ao Rev. P. Bielefeld, meu sôgro, que havia sido vilmente encarcerado. A seu pedido e mandato, o substituí em diversos atos eclesiásticos, proferí minha primeira prédica do púlpito a 14.4.1942, em Batatal e ali batizei duas crianças. (Sínodo Evangélico do Brasil Central – 50 Anos – 1912-1962, p. 16).
Registre-se: no auge da crise, o Sacerdócio Geral de Todas as Pessoas que Creem sustentou a Igreja, como já o havia feito em muitos outros momentos. Por ocasião da criação da Federação Sinodal em 1949, Benno Kersten também foi seu Procurador na Capital do país, então o Rio de Janeiro. Sempre ativo na igreja, foi reconhecido e homenageado com uma medalha de honra pelos serviços prestados no ano de 1959.
e) o Sínodo Evangélico do Brasil Central, através do trabalho do P. Höpfner, colocou à disposição das comunidades a 1ª Agenda de Cultos e Ofícios em português, isso já no ano de 1913, um ano após a fundação do Sínodo.
f) no pós guerra (1947), as comunidades se organizaram para desenvolver dois importantes trabalhos: reunir ajuda para as pessoas na terra natal e acolher os imigrantes em São Paulo. Deste trabalho junto aos imigrantes nascem as comunidades étnicas de pessoas expatriadas em São Paulo, sobretudo.
g) no pós-guerra o Sínodo Evangélico do Brasil Central iniciou um trabalho importante que deixa sinais até hoje. Dispôs-se a reorganizar comunidades fragilizadas no período da guerra em Teófilo Otoni/MG (templo destruído pela guerra), Belo Horizonte (patrimônio confiscado pelo exército) e a refundação da comunidade em Salvador, na Bahia, em 1958. Em 1959 foi realizada viagem pastoral a Recife, Belém do Pará e Manaus pelos pastores Walter e Johannes Schlupp com o objetivo de acompanhar as famílias migrantes. Neste mesmo ano foram acolhidas no Sínodo as comunidades étnicas estoniana, húngara e letã em São Paulo.
h) O Sínodo Evangélico do Brasil Central se propôs: fortalecer a consciência de uma só igreja evangélica; conservar e fortalecer a vida teuto-evangélica; prover diaconisas para assistência aos doentes e as congregações; formar professores evangélicos capacitados; prestar assistência espiritual aos evangélicos dispersos e fundar novas comunidades; providenciar assistência pastoral a comunidades sem pastor. (FISCHER, Joaquim)
i) O Sínodo Evangélico do Brasil Central fez parte da Federação Sinodal, antecessora da IECLB. Nesta federação foram desenvolvidos importantes trabalhos. O Sínodo foi ativo em vários deles. Cito:
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- A formação em terras brasileiras, sendo parte da criação da hoje Faculdades EST em São Leopoldo/RS (1946);
- O Sínodo sonhou com formação para ministros/as e lideranças também no sudeste brasileiro ao criar o Seminário de Pregadores em Araras, distrito de Petrópolis, RJ (1969);
- Entre os anos de 1947 e 1951 o P. Begrich participou da comissão que traduziu o texto bíblico para o português, resultando na criação da Sociedade Bíblica do Brasil (1948);
- O Sínodo Evangélico do Brasil Central, através da Federação Sinodal, participou ativamente no processo de consolidação e desenvolvimento das comunidades ao assumir tarefa na preparação de pastores ordenados, catequistas, diaconisas, professores, agendas litúrgicas, hinários, tradução e criação de compêndios teológicos, livros didáticos para a escola e o lar, trabalhos com juventude e adultos;
- Fez parte, desde o início com a Federação Sinodal, da Federação Luterana Mundial (1950), do Conselho Mundial de Igrejas (1950), da Sociedade Bíblica do Brasil (1948), da Confederação Evangélica do Brasil (1959).
Benno Kersten fala da importância do trabalho conjunto na Federação: “Toda a comunidade que se isola do convívio do universo, sofrerá com isso, tornando-se medíocre e mesquinha. Dessa regra a igreja não se exclui.” (Sínodo Evangélico do Brasil Central – 50 Anos – 1912-1962, p. 06)
Herdeiro da história e da promessa de fé
O Sínodo Sudeste é herdeiro desta história, sobretudo a história das comunidades da região de São Paulo e Campinas, do Rio de Janeiro e parte de Minas Gerais. Guarda para si a força da promessa da fé de que Deus está com seu povo (Mt 28.20). Vive o desafio de ser Igreja na diáspora geográfica e urbana. Encontra na diaconia importante forma de testemunhar o Evangelho de Jesus Cristo no mundo de hoje. Em meio à pluralidade teológica brasileira mantém-se firme no referencial bíblico e confessional não cedendo ao discurso da meritocracia e teologia da prosperidade. Permanece unido aos 18 Sínodos que formam a IECLB, sendo um deles. Fortalece a formação nacional e estimula a formação do Sacerdócio Geral nas Comunidades. Incentiva a capelania hospitalar e a formação educacional. Estimula a união das comunidades em Núcleos e Uniões Paroquiais para que sozinhas não se cansem no testemunho da fé e permaneçam solidárias. Celebra casamentos mistos e abençoa casais em segunda união. Batiza crianças e pessoas adultas. Sepulta os mortos. Acompanha as pessoas enlutadas e fortalece as que enfrentam as crises urbanas. Na imensidão de sua geografia, caminha com as pessoas que migram por razões de trabalho, saúde ou educação. Reúne-se ainda hoje em pequenos grupos comunitários. Aprendeu a ser Igreja minoritária num contexto da maioria populacional brasileira. Somos Sínodo ecumênico e participamos dos desafios regionais que nos são apresentados. Permaneceu ao lado das comunidades e famílias no tempo da pandemia do COVID-19.
Há, contudo, também diferenças em relação a 1912. Destaco uma delas, talvez a mais sensível e significativa: as comunidades de fé do Sínodo Sudeste reconhecem-se fiéis representantes do Evangelho de Jesus Cristo, mas não mais da germanidade. Esta é acolhida como fator histórico da formação de nosso povo, mas gradualmente cede lugar ao pluralismo de etnias e cores do povo brasileiro. Com poucas exceções, a membresia já não é mais majoritariamente de descendência alemã. Somos cada vez mais igreja em terras brasileiras. Cremos que Deus nos abençoa com dons que chegam através de pessoas das mais diferentes culturas e espiritualidades. Elas se encontram no testemunho de Cristo no jeito luterano de confessá-lo. A generosidade de Deus renova a igreja e a prepara para mais uma geração.
Marcos Jair Ebeling
P. Sinodal, Sínodo Sudeste-IECLB
São Paulo, junho 2025
Fontes de consulta
25 Jahre Mittelbrasilianische Synode (25 Anos do Sínodo Evangélico do Brasil Central). Disponível em: www.luterano.org.br/25-jahre-mittelbrasilianische-synode. Acesso em: 24.06.2025
Begrich, Martin (org). 1912-1962: em comemoração do 50º aniversário do Sínodo Evangélico do Brasil Central fundado em 28/30 de junho de 1912. São Paulo. Arquivo do Sínodo Sudeste. Também disponível em: www.luterano.org.br/sinodo-evangelico-do-brasil-central-50-anos-1912-1962. Acesso em: 24.06.2025
Ebeling, Marcos Jair. Linha do Tempo – Comunidades e Instituições do Sínodo Sudeste-IECLB. Disponível em: www.luterano.org.br/linha-do-tempo-sinodo-sudeste. Acesso em 24.06.2025.
Faculdades EST. Disponível em: https://est.edu.br/institucional. Acesso em: 24.06.2025.
FISCHER, Joaquim. Igreja Evangélica no Brasil Central: 75 anos. 28.06.1912. Disponível em: www.luterano.org.br/igreja-evangelica-no-brasil-central-75-anos. Acesso em 24.06.2025. (originalmente publicado em: Anuário Evangélico, Editora Sinodal, 1987)
SCHŰNEMANN, Rolf. Sínodo Evangélico do Brasil Central – Caminhada comum na diáspora do país. Disponível em: www.luterano.org.br/sinodo-evangelico-brasil-central-100-anos-de-caminhada-comum-na-diaspora-do-pais. Acesso em 24.06.2025.