O Evangelho segundo Lucas nos apresenta uma das parábolas mais conhecidas e mais desafiadoras de Jesus: a do bom samaritano. Um doutor da Lei, querendo justificar-se, pergunta a Jesus: “E quem é o meu próximo?” (Lc 10.29). Essa pergunta, aparentemente simples, revela algo profundo sobre o coração humano: nossa tendência de limitar o amor, de traçar fronteiras entre “os meus” e “os outros”.
Jesus responde com uma história que inverte toda lógica: um homem é assaltado e deixado à beira do caminho. Passam por ele um sacerdote e um levita, homens da religião, mas nenhum se aproxima. Somente um samaritano — estrangeiro e desprezado — é quem se compadece, aproxima-se, cuida e garante a recuperação daquele que foi ferido.
O gesto do samaritano é o coração do Evangelho: a proximidade que se faz com cuidado. Jesus nos convida a mudar a pergunta. Não é “quem é o meu próximo?”, mas “de quem eu me torno próximo?”. O próximo não é quem se encaixa nas nossas fronteiras, mas aquele a quem decidimos amar.
Essa parábola não fala apenas das relações humanas, mas de toda a criação. A salvação, segundo o Evangelho, é comunitária — uma comunhão de vida entre humanos e não-humanos. Não há céu possível se a Terra estiver ferida; não há amor verdadeiro se reduzirmos o outro, seja pessoa ou criatura, à condição de inimigo.
O medo é o que cria o inimigo: medo do diferente, do desconhecido, do que foge ao nosso controle. Mas o amor é o remédio para o medo. Ele começa no gesto simples de aproximar-se: fazer do distante um próximo, e do próximo, um irmão ou uma irmã. No caminho da aproximação nascem o diálogo, o conhecimento, a aceitação, o respeito, o amor — e, por fim, o cuidado.
Cuidar é o verbo do Evangelho. Cuidar do caído na estrada, cuidar das formas de convivência, cuidar do meio ambiente, cuidar da Mãe-Terra — para que ela seja uma casa de todos, onde o convívio entre os diferentes seja possível e belo.
Quando nos cuidamos como irmãos e irmãs, desaparecem as causas do medo. Ninguém precisa ameaçar ninguém. A estrada de Jericó, antes símbolo de um mundo violento e dividido, torna-se estrada de encontro, onde os feridos são acolhidos, o estrangeiro é reconhecido e a vida volta a florescer em comunhão.
Que a voz de Jesus continue a ecoar entre nós: “Vai e faz tu o mesmo.” Vai, aproxima-
te, cuida. Porque é no cuidado que o Reino de Deus se revela.
Oração: Senhor da estrada e da vida, tu que nos encontras em cada curva do caminho, ensina-nos a ver com os teus olhos e a sentir com o teu coração. Livra-nos do medo que cria inimigos, do orgulho que nos separa e da indiferença que nos faz passar adiante diante da dor dos que caem à beira da estrada.
Dá-nos a coragem do samaritano, que não perguntou quem era o outro, mas se aproximou, tocou e cuidou. Que também nós aprendamos a nos fazer próximos — dos feridos, dos esquecidos, dos diferentes, dos humanos e dos não-humanos, de toda vida que sofre e clama por compaixão.
Faz de nós guardiões da tua criação, para que cuidemos da Terra como de uma irmã e das criaturas como de companheiras de jornada. Que o amor supere o medo, que o diálogo desfaça os muros e que a paz floresça onde antes havia distância.
Senhor, ajuda-nos a compreender que a verdadeira fé não está nas palavras, mas nas mãos que curam, nos passos que se aproximam e no coração que acolhe. E quando nos perguntares, como naquele dia: “Qual deles foi o próximo daquele homem?”, possamos responder com a vida: “Fui eu, Senhor — porque o teu amor me moveu.” Amém.
Pastor Daniel Ricardo da Costa
Paróquia de Igrejinha