Proclamar Libertação – Volume 47
Prédica: Isaías 9.2-7
Leituras: Lucas 2.1-19* e Tito 2.11-14
Autoria: Carlos Arthur Dreher
Data Litúrgica: Dia de Natal
Data da Pregação: 25/12/2022
O texto previsto para a pregação, Isaías 9.2-7, já foi trabalhado, em maior ou menor extensão, por quatro vezes em Proclamar Libertação, a saber, nos volumes V, XVIII, 22 e 38. Na constelação atual, acompanhado dos textos de Lucas e Tito, uma vez, em PL XVIII.
Lucas 2.1-19 relata a história do nascimento de Jesus e da visita dos pastores à manjedoura. Tito 2.11-14 acentua a graça salvadora de Deus que nos educa para uma vida sensata, justa e piedosa, apontando para a manifestação da glória de Jesus Cristo. Os três textos, cada qual à sua maneira, apontam para esperança.
O versículo anterior, Isaías 9.1, nos dá uma evidência clara sobre o lugar na história de nosso texto. A terra de Zebulom e a terra de Naftali foram tornadas desprezíveis. Trata-se do caminho do mar, além do Jordão, a Galileia dos gentios.
Estamos no norte da Palestina, onde se localizam os territórios das tribos de Zebulom e Naftali. Desde que os assírios, em seu avanço a partir de 734 a. C., tomaram a região, ela passou a ser denominada Hagalil hagoyim, o distrito dos gentios, ou Galileia (círculo, distrito) dos gentios. O texto aponta, pois, para dominação estrangeira. A região está tomada pelas trevas dessa dominação.
No entanto, em meio às trevas vai surgindo uma luz, que vai crescendo até tornar-se uma grande luz, uma luz do tamanho da esperança. Esse povo se alegra muito, como se alegra na colheita, ou como, ao vencer uma batalha, reparte os despojos. A alegria toma conta em meio ao sonho: o jugo foi quebrado, a vara que o feria foi quebrada, o cetro do opressor também. A bota do soldado inimigo e a sua veste serão queimadas. A derrota do inimigo fará lembrar o dia em que Gideão derrotou os midianitas (Jz 7).
Esse sonho brota do fato de um menino haver nascido para esse povo; um filho lhe foi dado. Sobre seus ombros está o governo! Quem é esse menino? Enquanto os comentários e a maioria dos autores de Proclamar Libertação o veem como um novo rei sendo entronizado (veja, por exemplo, Michael Kleine em PL 38), para o que apontam os nomes que recebe: Maravilhoso Conselheiro, Deus Forte, Pai da Eternidade, Príncipe da Paz, Milton Schwantes, em PL V, vai contra a corrente, afirmando, com base nos textos anteriores de Isaías, tratar-se “da criança de um João qualquer”. Se há argumentos para os dois lados, verdade é que, diante do poder e da força militar dos assírios, ambos são fracos. Não é necessário explicar isso sobre a criança.
Sobre o rei, que parece ser Ezequias (725-697 a. C.), há que lembrar que seu antecessor, Acaz, se havia tornado vassalo tributário dos assírios. Ezequias seguiu esse caminho, até 705 a. C. Nesse ano morreu o imperador assírio Sargão, e seu sucessor Senaqueribe ficou alguns anos lutando para estabelecer a ordem no império.
Ezequias e outros reis da Palestina pensaram que havia chegado a hora de libertar-se do jugo assírio. Suspenderam o pagamento de tributos, retiraram os deuses assírios de seus templos e tentaram recuperar territórios perdidos. Estava aí a grande luz!
Contudo, a grande luz minguou em seguida. Em 701 a. C., Senaqueribe havia assumido o controle na Assíria e voltou sua atenção para o oeste, retornando à Palestina com seus exércitos. Entre outras ações, cercou Jerusalém. Textos assírios dizem que Senaqueribe teria trancado Ezequias em Jerusalém como um passarinho em uma gaiola.
O sonho havia acabado. A “grande luz” se havia apagado! O menino e o rei não eram páreo para os assírios. Tampouco os nomes cheios de significado dados ao rei ajudavam.
Na noite de Natal, gosto de apagar todas as luzes da sala e, depois, ir acendendo uma a uma as velas do pinheirinho. A pequena luz da primeira vela acesa vai crescendo, à medida que se acendem as outras. Ao final, há uma boa luz, não tão grande, mas suficiente para que nos reconheçamos e possamos nos abraçar, Então, cantamos, olhamos o presépio montado sob a árvore e, diante da ansiedade dos pequeninos, começamos a distribuir os presentes. Aí acendemos novamente as luzes da sala, e a luz se torna grande.
Em Gramado/RS, celebra-se, todos os anos, o Natal Luz, por ocasião da época de Natal. Em inúmeras cidades, se não em todas, há sempre uma árvore
real ou artificial cheia de luzes. A partir de 06 de janeiro, essas luzes todas se apagam, e voltamos à realidade do dia a dia.
Assim é com muitas das nossas esperanças. Esperamos que tudo mude para melhor, mas não é isso que acontece. A grande luz esmorece… O mesmo me ocorre quando olho para a história de Natal narrada em Lucas 2.
Que esperança traz esse menino nascido numa estrebaria e deitado numa manjedoura? Os anjos não conseguem apagar a triste notícia da trágica morte desse menino na cruz de Gólgota.
Sim, ele tem até uma coroa na cabeça, mas é uma coroa de espinhos. Sobre ele, no topo da cruz, está a inscrição, em diversas línguas: Jesus Nazareno Rei dos Judeus (INRI). A declaração de que é rei está ali como escárnio sobre esse pobre homem.
Em sua vida, foi um Maravilhoso Conselheiro, foi visto como Deus Forte e Pai da Eternidade, foi declarado Príncipe da Paz. Contudo, não fosse a sua ressurreição, anunciada por seus seguidores, que restaria desse Jesus de Nazaré? Apenas uma pequena luz – não a grande! – prestes a apagar-se.
As frustrações se acumulam desde o texto de Isaías até uma mirada histórica sobre a vida do menino da manjedoura. E, não obstante, o evangelho insiste em apoiar-se na fraqueza.
Sim, nosso Deus é um Deus que vem de baixo. É o Deus dos escravos no Egito, é o Deus do povo dominado pelos assírios, passando a viver em trevas. É também, e muito mais, o Deus da manjedoura e da cruz! É nesse Deus que cremos, e cremos que ele nos levará à grande luz!
Após a saudação inicial, proponho convidar as pessoas presentes a fecharem os olhos por alguns instantes. Ideal seria se o culto fosse à noite – apagar todas as luzes e deixar o templo totalmente às escuras –, porém, o culto de 25 de dezembro raramente acontece à noite.
De olhos fechados, a comunidade é convidada a lembrar de dificuldades, problemas, frustrações, aflições, morte e luto, angústias pessoais e ao redor do mundo. Depois de alguns instantes, proceder à leitura do texto de Isaías 9.2-7. Em seguida, pedir às pessoas que abram os olhos.
Passo seguinte seria discorrer sobre o texto de Isaías em seu contexto histórico. Salientar que, apesar da beleza das palavras de esperança, nada daquilo se concretizou. As trevas continuaram a pesar sobre aquele povo.
Em seguida, dever-se-ia fazer uma comparação com a narrativa do Natal em Lucas. O menino na manjedoura, pobre e humilde, terminará seus dias numa cruz. Será rei com uma coroa de espinhos na cabeça. Não fosse a mensagem de Páscoa, também a luz do Natal seria dominada pelas trevas. E é de se perguntar se, mesmo assim, a luz do Natal não parece utópica diante da realidade do mundo.
Não vejo muito espaço para incluir aqui a mensagem de Tito 2. Isaías e Lucas são suficientes e suficientemente claros para destacar a mensagem da esperança natalina contra toda a esperança.
O esforço final deveria ser exatamente este: Natal insiste teimosamente em anunciar e proclamar a esperança pela grande luz. É tarefa difícil! Não obstante, é aí que reside a nossa fé!
Para versículo de introito, proponho Tito 2.13s: Aguardamos a bendita esperança e a manifestação da glória do nosso grande Deus e Salvador Cristo Jesus, o qual a si mesmo se deu por nós, a fim de remir-nos de toda iniquidade.
Em seguida, sugiro a leitura de Lucas 2.1-20 em parcelas alternadas com estrofes de hinos de Natal (1-5; 6-7; 8-9; 10-12; 13-14; 15-18; 19-20). A escolha dos hinos fica a critério da pessoa responsável pela liturgia.
Para a oração de intercessão, seria oportuno pedir à comunidade que expresse suas angústias, dificuldades e frustrações sentidas ao fecharem os olhos anteriormente. A oração deveria expô-las diante de Deus e pedir por sua grande luz.
O hino final poderia ser o LCI 262.
Ao longo deste estudo, utilizei os subsídios anteriores em Proclamar Libertação, a saber, nos volumes V, XVIII, 22 e 38.
Além disso, importante foi SCHWANTES, Milton. Da vocação à provocação. Estudos exegéticos em Isaías 1-12. 3. ed. ampl. São Leopoldo: Oikos, 2011.
* O texto bíblico previsto pelo Lecionário Comum Revisado da IECLB é Lucas 2.1-14.
Proclamar libertação é uma coleção que existe desde 1976 como fruto do testemunho e da colaboração ecumênica. Cada volume traz estudos e reflexões sobre passagens bíblicas. O trabalho exegético, a meditação e os subsídios litúrgicos são auxílios para a preparação do culto, de estudos bíblicos e de outras celebrações. Publicado pela Editora Sinodal, com apoio da Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil (IECLB).