O que caracteriza a igreja luterana? No mês de outubro, lembramos de formal especial a Reforma Protestante, que provocou mudanças profundas no Cristianismo. A Reforma deu origem a uma nova vertente na religião cristã: o protestantismo. Nesta vertente, estão as igrejas luteranas. Confira suas principais características:
O que é religião?
Embora tenha relação com a fé, religião e fé não são a mesma coisa. Uma religião é um sistema de crenças que envolve rituais, cerimônias, práticas, textos, tradições orais, princípios, valores e formas de organização.
As 4 maiores religiões do mundo são: Cristianismo, Islã, Hinduísmo e Budismo. O Cristianismo é a maior delas.
Há, ainda, milhares de religiões tradicionais ao redor do mundo, especialmente na África e na Ásia. Também no Brasil há uma diversidade de tradições religiosas entre os povos originários (indígenas).

O que caracteriza o Cristianismo?
O Cristianismo é uma religião monoteísta, assim como o Judaísmo e o Islã. Estas três religiões compartilham outra característica comum: são religiões abraâmicas. Isto significa que elas reconhecem a aliança que Deus fez com Abraão (Gênesis 12).
Entretanto, há questões que diferenciam e a principal delas é Jesus Cristo. A característica básica do Cristianismo é a fé em Jesus como Filho de Deus e Salvador. Apesar da consideração em relação a Jesus, Judaísmo e Islã não reconhecem que Jesus Cristo é o Filho de Deus.
No primeiro artigo de sua Constituição, a Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil afirma que é Igreja de Jesus Cristo. Com esta declaração, a IECLB se insere na religião cristã.
O Cristianismo, contudo, tem diferentes ramificações e vertentes. A maior religião do mundo é certamente a mais fragmentada. São tantas vertentes e denominações que é impossível precisar o número. As três maiores vertentes cristãs são a católica, ortodoxa e protestante.
As igrejas luteranas fazem parte da vertente protestante. Mas, desta vertente, fazem parte ainda várias outras denominações que, por sua vez, são bastante diferentes.
O que caracteriza uma igreja de confissão luterana?
Jesus Cristo é o fundamento da Igreja Cristã. Este é, igualmente, o fundamento das igrejas de confissão luterana. E, assim como outras igrejas cristãs, as igrejas luteranas encontram na Bíblia a sua base de fé.
Mesmo que as igrejas luteranas não sejam todas iguais, elas compartilham uma base doutrinária comum. No caso da IECLB, a base doutrinária considera os credos antigos (Apostólico, Niceno e Atanasiano), a Confissão de Augsburgo e o Catecismo Menor de Martim Lutero.
De forma geral, é possível resumir a base doutrinária das igrejas luteranas em quatro princípios:
- Somente Cristo (SOLUS CHRISTUS)
- Somente a graça (SOLA GRATIA)
- Somente a fé (SOLA FIDES)
- Somente a Escritura (SOLA SCRIPTURA)
Estes princípios, também conhecidos como pilares da Igreja Luterana, servem de orientação para a vida de cada pessoa.

Somente Cristo (SOLUS CHRISTUS)
Por muito tempo, Martim Lutero compreendeu Deus como um ser terrível, que punia em vida e condenava após a morte. Apesar de se esforçar em orações, meditações e boas ações, ele não conseguia encontrar paz. Quanto mais procurava se aproximar de Deus, mais sentia que se afastava.
A vida de Lutero mudou quando ele entendeu que Deus não quer a condenação da pessoa pecadora. Através de Jesus Cristo, Deus concede o perdão. A esta ação divina, damos o nome de justificação. Justificação significa que Deus toma para si a nossa injustiça (pecado) e nos dá a sua justiça (perdão).
Mesmo recebendo a justificação, toda pessoa ainda permanece sujeita ao pecado. Por isso Lutero dizia que somos pessoas simultaneamente justas e pecadoras.
Nesta existência marcada pela ambiguidade, Jesus Cristo nos acompanha e permite a comunhão com Deus. Não precisamos da intermediação de pessoas ou de instituições. Somente Cristo basta.
Somente a graça (SOLA GRATIA)
O princípio “somente a graça” declara que não há qualquer possibilidade de a pessoa fazer por merecer sua justificação. Não podemos trocar méritos próprios por benefícios divinos. Portanto, não há justificação por merecimento, produtividade ou pagamento.
A justificação é concedida por Deus de graça! Nada precisamos e, na verdade, nada podemos fazer para obter o amor e o perdão de Deus. Tudo é concedido gratuitamente por Deus, que acolhe sem exigência prévia e sem requerer compensação posterior. A única que coisa que precisamos fazer é aceitar a dádiva divina.
O esforço de uma pessoa para conseguir justificação diante de Deus pode gerar angústia ou vanglória. A angústia surge quando a pessoa se sente incapaz de fazer tudo o que seria necessário. A vanglória, por outro lado, se manifesta quando a pessoa se envaidece com suas boas obras. Neste sentido, a graça de Deus nos liberta da angústia e da tentação da vanglória pessoal.
A graça de Deus é a manifestação de um amor que acolhe sem impor condições e não tem outro interesse a não ser o bem e a nossa salvação.

Somente a fé (SOLA FIDES)
Na Bíblia, Lutero aprendeu que não podemos alcançar a justificação através de boas ações, mas apenas mediante a fé (Romanos 3.28). A fé é um ato de confiança que não é nosso, mas um presente dado por Deus. Neste sentido, os princípios “somente a fé” e “somente a graça” estão intimamente ligados (Efésios 2.8). É por isso que também se fala em justificação por graça e fé.
Lutero descobriu a justificação pela fé depois que compreendeu a justiça de Deus. Justiça de Deus significa que a pessoa vive através da dádiva divina, ou seja, da fé (Romanos 1.17). A confiança é o cerne da fé. Pessoa justa não é aquela que pode exibir méritos, e sim aquela que deposita sua confiança em Deus.
Mesmo que as boas obras não possam contribuir para a justificação, a prática do bem não está dispensada. Aliás, Lutero nunca condenou as obras, mas somente a intenção de adquirir a justificação através delas. As boas obras surgem como consequência da justificação, e não como condição para obtê-la.
Não fazemos boas obras para conquistar o céu, mas para preservar o mundo. Isto acontece especialmente na ajuda às pessoas em necessidade e no cuidado com o meio ambiente, a criação de Deus.
Somente a Escritura (SOLA SCRIPTURA)
“A minha convicção vem das Escrituras a que me reporto, e minha consciência está cativa na palavra de Deus”. Com estas palavras, Lutero declarou que não queria e nem podia se retratar dos escritos pelos quais estava sendo acusado de heresia.
A Reforma Protestante atribuiu à Bíblia a autoridade máxima. Lutero estava convicto de que cada pessoa, a partir do estudo bíblico, seria capaz de compreender as questões básicas da fé. Foi esta convicção que o impulsionou a traduzir a Bíblia para a língua do povo.
Por ser palavra de Deus, a Bíblia é Escritura Sagrada. Entretanto, o papel no qual ela está impressa não é sagrado. Por isso, a Bíblia não deve ser adorada, nem utilizada como amuleto para trazer sorte ou proteger de perigos.
A Bíblia não caiu do céu. Ela foi escrita por pessoas. Neste sentido, há passagens que manifestam a mentalidade e o conhecimento de certas épocas e contextos. Esta questão precisa ser considerada para evitar leituras fundamentalistas que podem contrariar o “espírito” da Bíblia. De Lutero aprendemos que o “espírito”, ou seja, o critério para leitura e interpretação, é o testemunho do amor de Deus, revelado em Jesus Cristo.

Sacerdócio geral de todas as pessoas que creem
O Sacerdócio geral de todas as pessoas que creem é igualmente uma característica luterana. O termo sacerdócio tem conexão com a palavra sacerdote. De modo geral, define-se sacerdote ou sacerdotisa como a pessoa que ministra sacramentos e é mediadora entre Deus e os seres humanos.
Na época de Lutero, predominava uma concepção de categorias desiguais de pessoas cristãs. Na parte superior estava o clero e, em um nível mais baixo, estavam as pessoas leigas. A pretensa superioridade do clero era conferida pela ordenação ao sacerdócio. Lutero contestou esta divisão a partir de dois preceitos bíblicos:
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- Jesus Cristo é o único mediador entre Deus e os seres humanos (1 Timóteo 2.5-6; Hebreus 4.14).
- Todas as pessoas cristãs fazem parte do sacerdócio (1 Pedro 2.9; Apocalipse 5.10).
Ora, se Jesus Cristo é o único mediador, nenhuma pessoa pode ser intermediária da fé. E se todas as pessoas fazem parte do sacerdócio, não pode haver categorias distintas de pessoas cristãs.
Todas as pessoas batizadas fazem parte do sacerdócio. E o que é o sacerdócio? A função do sacerdócio nada mais é do que o testemunho e a vivência do evangelho de Jesus Cristo. Sacerdócio geral significa que cada pessoa participa e é responsável pelo testemunho do evangelho em palavra e em ação.
A partir da concepção do sacerdócio geral, as Igrejas Luteranas, em especial a IECLB, dão ênfase à participação compartilhada na organização e na condução da vida comunitária. Pessoas do Ministério com Ordenação e pessoas que não estão no Ministério com Ordenação podem participar de decisões em todas as instâncias e se engajar em diferentes atividades, contribuindo com recursos, capacidades e dons para a missão de Deus.

Texto: Emilio Voigt
Leia também: Qual é a origem da Igreja Luterana?
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