A Rede de Mulheres e Justiça de Gênero da América Latina e Caribe disponibiliza uma reflexão da Pastora Dra. Marcia Blasi, Executiva do Programa de Justiça de Gênero e Empoderamento de Mulheres da Federação Luterana Mundial (FLM). A meditação faz parte de uma jornada litúrgica e tem como base a história de Rispa, narrada em 2 Samuel 21.1-14
Nossa jornada litúrgica, que começou no primeiro domingo do Advento, continua. Avançamos em uma espiral que se abre cada vez mais, aproximando-nos do coração do amor e da justiça de Deus.
O tempo da Quaresma nos chama a reconhecer as dores do mundo – as dores dentro de nós e aquelas carregadas pelas mulheres ao nosso redor. É um tempo para nomear o sofrimento, lamentar e permanecer em solidariedade umas com as outras.
Anos atrás, teólogas da América Latina se reuniram para refletir sobre a história de Rispa. Sua história, narrada em 2 Samuel 21.1-14, é uma história de luto, resistência e protesto. Entre as muitas violências que sofreu, a execução brutal de seus dois filhos a levou a tomar medidas extremas.
Então Rispa, filha de Aiá, pegou um pano de saco e o estendeu para si sobre uma rocha. Desde o início da colheita até cair chuva do céu sobre os corpos, ela não deixou que as aves de rapina os tocassem de dia nem os animais selvagens à noite.
(2 Samuel 21.10)
A vigília de Rispa foi um ato de amor e resistência. Ela se recusou a permitir que os corpos de seus filhos fossem esquecidos, mesmo quando o mundo seguia em frente.
Mulheres de diferentes gerações viveram essa realidade. Mulheres sofreram a perda de filhas, filhos, netos, netas, sobrinhas, amigas – vítimas de regimes militares, facções criminosas, pobreza, falta de educação e acesso inadequado à saúde. Em seus próprios corpos, sentiram o peso da injustiça de gênero: assédio, violência, exploração de seus conhecimentos, de sua força física e de seus corpos.
Hoje, ouvimos o clamor das mulheres que tomam medidas, pequenas ou extraordinárias, para se protegerem e protegerem aquelas pessoas que amam. Sua dor e sua resistência ecoam pelos continentes.
Nesta Quaresma, sentemo-nos com Rispa. Estendamos nosso pano de saco ou nossa manta. Vigiemos. Oremos. Aprendamos umas com as outras e sobre nós mesmas. Reconheçamos as feridas em nossos corpos e em nossas comunidades. Esperar, por mais difícil que seja, também é um ato sagrado. Como Rispa, não podemos desviar o olhar. Mantemos vigília, às vezes sozinhas, às vezes acompanhadas. Reunimos forças para a luta pela justiça que está por vir.
Um mundo com justiça de gênero exige nossa participação. Nenhuma ação é pequena demais. Nenhuma oração fica sem resposta. Não estamos sozinhas. Como filhas de Deus, salvas e justificadas pela graça mediante a fé, e movidas pelo Espírito Santo, oramos:
Deus de misericórdia,
Tu tens ouvido o clamor do teu povo de geração em geração.
Senta-te conosco em nossa dor e incerteza.
Ouve nosso choro.
Cura a dor que pesa sobre nossos corpos e almas.
Dá-nos nova imaginação, corações abertos e força para seguir em frente.
Protege-nos e mantém-nos seguras.
Torna-nos ousadas no amor, incansáveis na justiça e inabaláveis na esperança.
Em nome de Jesus, oramos. Amém.
Bênçãos,
Pa. Dra. Marcia Blasi
Executiva do Programa de Justiça de Gênero e Empoderamento de Mulheres
Federação Luterana Mundial